O Projeto de Lei Complementar nº 146/2019(“PLP”), conhecido como “Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador” foi sancionado na última terça-feira, 01 de junho 2021, com vetos, pelo Presidente Jair Bolsonaro e convertido na Lei Complementar 182/2021 (“LC”), com a respectiva publicação no Diário Oficial da União (DOU). O texto da referida LC, que já tinha sido objeto de aprovação pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados no âmbito do PLP, traz diversas mudanças legislativas relevantes, com o objetivo de fomentar o ecossistema de startups, por meio da desburocratização de processos e do aumento da segurança jurídica para investimentos, dentre as quais, podemos citar as seguintes principais alterações:

  • Definição de startup prevista em lei: organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados e que possuam os seguintes requisitos: (a) receita bruta de até R$ 16.000.000,00 no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 meses, independentemente da forma societária adotada; (b) até 10 anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); e (c) declaração em seu ato constitutivo ou alterador e utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços ou enquadramento no regime especial Inova Simples, nos termos do art. 65-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Para fins de clareza, são elegíveis para o enquadramento na modalidade de tratamento especial destinada ao fomento de startup, o empresário individual, a empresa individual de responsabilidade limitada, as sociedades empresárias, as sociedades cooperativas e as sociedades simples;
  • Dispensa da exigência de realizar as publicações ordenadas pela Lei das Sociedades por Ações no Diário Oficial e em jornais de grande circulação para as sociedades por ações com receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00, possibilitando as publicações de forma eletrônica, em exceção ao disposto no Art. 289 da Lei das Sociedades por Ações, bem como possibilitando para essas sociedades a substituição dos livros societários por registros mecanizados ou eletrônicos. Exclusão do critério de número máximo de 30 acionistas aprovado pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados, principalmente em razão do investimento via crowdfunding, modalidade em que a startup recebe aportes financeiros de muitos investidores ao mesmo tempo. A legislação atual prevê a dispensa de publicação para sociedades com menos de 20 acionistas e patrimônio líquido inferior a R$ 10.000.000,00;
  • Permissão para que sociedades por ações tenham apenas um diretor;
  • Possibilidade de contratação de pessoas físicas ou jurídicas pelo Estado para a realização de testes de soluções inovadoras por meio de licitação na modalidade especial regida pela LC. Trata-se de um grande instrumento de fomento à inovação focada na solução de problemas econômicos e sociais enfrentados pelo Estado, aproximando o setor público às soluções inovadoras;
  • O investidor-anjo não será considerado sócio, tampouco terá direito a gerência ou voto na administração da startup, mas poderá participar de deliberações em caráter estritamente consultivo e não responderá por obrigações ou dívidas da startup, inclusive em recuperação judicial ou em desconsideração da personalidade jurídica (exceto em caso de dolo, fraude ou simulação), trazendo mais segurança jurídica para o seu investimento;
  • Será permitido o aporte em startups de pessoa física e pessoa jurídica, além de fundos de investimento, que poderão ou não resultar em participação no capital social da startup. Os investidores poderão utilizar algumas modalidades de investimento, como por exemplo, contrato de opção de subscrição ou compra de ações ou quotas, debêntures e mútuos conversíveis em participação societária, dentre outros instrumentos de aporte de capital que não expresse interesse das partes em formalizar uma sociedade e subscrição de participação representativa do capital social da startup. Em relação aos fundos, as regras deverão ser definidas em regulamento pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM);
  • A CVM regulamentará as condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte (receita bruta anual inferior a R$ 500.000.000,00) ao mercado de capitais e será permitido dispensar ou modular algumas exigências, como conselho fiscal, intermediação de instituições financeiras em distribuições públicas de valores mobiliários etc.;
  • Na hipótese de omissão do Estatuto Social quanto à distribuição de dividendos, estes serão estabelecidos livremente pela Assembleia Geral, hipótese em que não se aplicará o disposto no Art. 202 da Lei das Sociedades por Ações (dividendo mínimo obrigatório), desde que não seja prejudicado o direito dos acionistas preferenciais de receber os dividendos fixos ou mínimo a que tenham prioridade; e
  • Também foi permitida a criação de um “sandbox regulatório”, um ambiente experimental com condições especiais e simplificadas para que órgãos competentes autorizem temporariamente pessoas jurídicas a desenvolverem tecnologias e modelos de negócios inovadores e testar técnicas e tecnologias experimentais, podendo para tanto afastar a incidência de normas de sua competência. Essa é uma regra que torna mais ampla a possibilidade às startups de comercialização experimental provisória, antes de procederem à comercialização plena e à obtenção de receita.

Os artigos que tratavam sobre plano de outorga de opção de compra de ações (stock options) e que constavam no texto inicial da PLP foram excluídos pela relatoria do projeto no Senado Federal. O plano de stock options é um mecanismo importante para atração e retenção de talentos, especialmente para as startups que precisam de mão de obra qualificada, mas que não possuem recursos suficientes para oferecer uma remuneração competitiva aos seus colaboradores. O artigo 16 do texto original da PLP previa que a remuneração poderia ser complementada com bônus que consideraria a eficiência e a produtividade da empresa, do empregado ou do time de empregados, ou outros objetivos e parâmetros que as partes vierem a acordar, incluída a remuneração decorrente da outorga de opção de compra de ações (stock options). Os artigos 17 e 18 inseriam as opções de compra de ações como remuneração do empregado e contribuinte nas legislações de seguridade social e do imposto de renda, respectivamente, considerando-se paga ou apurada, quando do exercício da opção. Todos os artigos que faziam remissão às stock options foram retirados do texto sob o argumento de que não há precisão na ciência, tampouco nos tribunais sobre a natureza jurídica das stock options (se mercantil ou remuneratória, o que muda a tributação aplicada). O ideal seria a aprovação de um texto que garantisse às stock options natureza mercantil, não remuneratória, conforme vasta jurisprudência administrativa e do Poder Judiciário, como assim estava no texto original do PLP, mas que foi substituído pela Câmara dos Deputados. No entanto, esse trecho foi retirado do texto sob o argumento de que as stock options são utilizadas por diversas sociedades, não apenas por startups, devendo o tema ser debatido em outro projeto específico de lei, de forma mais ampla.

Além disso, também não foi contemplada pela Câmara e pelo Senado a possibilidade de as startups optarem pelo Simples Nacional sem se sujeitarem a certos impedimentos aplicados às demais empresas comuns, de forma a possibilitar a organização dessas startups sob a forma de sociedade por ações, constituição das startups por sócias pessoas jurídicas ou domiciliadas no exterior, além da tributação reduzida a investimentos-anjo e a dedução de valores integralizados no capital social da base de cálculo do imposto de renda.

Por fim, importante ressaltar que foi vetado pelo Presidente a mudança sugerida no âmbito da apuração do ganho de capital. No PLP, o Congresso Nacional tinha sugerido uma redução no imposto a ser pago por investidor-anjo em alienação de sua participação societária na startup, de modo que a perda incorrida em determinado investimento pudesse compor o custo de aquisição para fins de cálculo de imposto sobre o ganho de capital auferido em determinada venda do investimento realizado, o que acabou não sendo aprovado pelo Presidente.

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